Siga a linha vermelha
Mirla Fernandes
Brasil
Julho 2010
Continuando meu post anterior, eu gostaria de dar um salto de alguns anos até o começo da década de 60, com o aparecimento de uma figura chave na arte brasileira, Lygia Clark. Como escreve a crítica de arte Suely Rolnik no ensaior “The Body’s Contagious Memory”, seus trabalhos experimentais são "geralmente entendidos como experiências multisensoriais cuja importância recai na superação da redução da pesquisa artística ao campo do olhar."
Em1969, Lygia Clark escreveu: “No momento que o artista digere o objeto, ele é digerido pela sociedade que já o definiu com um título e uma função burocrática: ele será o futuro engenheiro do lazer, uma atividade que não tem nenhum efeito no equilibrio das estruturas sociais"
Eu começo citando Clark pois em relação a Art Jewellery, sempre corremos o risco de cair na "virtuosidade glamurosa para preencher um discurso vazio, um pastiche completamente esvaziado de crítica, que pode ser facilmente digerido pelo mercado e serve perfeitamente às demandas pela estetização" como explica Rolnik.
Dito isso, eu gostaria de mencionar o trabalho da artista brasileira que não cai absolutamente nesta armadilha contemporânea, Dani Soter. Assim como Clark, Dani Soter viveu em Paris onde se graduou em Linguas e Civilizações (Sorbonne). Foi uma crise pessoal que a levou as práticas artísiticas. Hoje, Soter está de volta a Paris após ter vivido em Lisboa onde estudou joalheria na Ar.Co.
Sua primeira mídia de experimentação foi a fotografia. Elas em geral se referem ao vazio, um sentido de ausência, seja no corpo ou de um tempo que passou. Seus trabalhos são de alguma forma uma tradução para o meio plástico o universo de Clarice Lispector.
Assim como nos textos de Lispector, sentimos nas peças de Soter uma atmosfera de silêncio, de um parar do tempo para sentir a beleza do ordinário.
É de suas fotografias que primeiro emergem as linhas vermelhas. Como ela mesma diz:" Estou interessada em comunicação e mapas. Desenhar é a maneira mais direta de comunicar algo, seja uma passagem, um sentimento ou uma ideias. Nos mapas o que mais me interessasão as linhas vermelhas traçadas para mostrar como se chega de um ponto a outro. A linha funciona como uma conecção".
Como uma Ariadne contemporânea, Soter e suas linhas vermelhas conectam pontos de vazio marcando territórios. A conecção que existe em seu pensamento artístico a permite passear por diversas mídias, sugerindo uma na outra: “Eu evito retrabalhar as fotografias. Eu gosto de irregularidades, da fragilidade das formas que um desenho pode ter, a espontaneidade do gesto. Deixando os traçosse transformarem em linhas que são como prolongamentos dos movimentos do corpo. As " tattoos" são desenho-jóias”.
As linhas desenhadas tornam-se ainda mais irregulares quando ela decide usar seu próprio cabelo para evocar o eterno e ao mesmo tempo se referir ao efêmero. Para ela é quando a jóia e o desenho se encontram. Sendo as linhas derradeiras do corpo, os cabelos refletem a fragilidade.
Seja em papel ou em algum meio tridimensional, seus trabalhos geralmente envolvem uma certa possibilidade de interação e vão alem de categorizações. É inútil tentar classifica-los como fotografia (que fala do desenho) ou objeto (que fala da jóia) ou jóia (que é um objeto). Definições simplistas não se aplicam aqui. O melhor de tudo é que ela em seus trabalhos nos deixa a melhor parte : sermos livre para completarmos os sentidos.
Dani Soter participou do projeto Walking the Gray Area blog e fará parte da exposição itinerante Think Again que abre sua primeira edição agora em Outubro no MAD Museum, New York.
Mirla Fernandes, Julho 2010